Rinite na Gravidez

 em Obstetrícia

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Introdução:

A rinite gestacional é uma condição relativamente comum e pouco discutida na literatura nacional. Ela vem ganhando importância nos últimos anos principalmente pela descoberta de sua associação com o ronco e com a síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS) na gestação e, indiretamente, com a pré-eclâmpsia, importante causa de morbidade e mortalidade materna. Além disso, há trabalhos que mostram sua associação com a hipertensão gestacional, retardo de crescimento intrauterino e menores escores de APGAR em recém-nascidos.

Ainda hoje, muito se confunde em relação à terminologia da rinite gestacional. Alguns autores denotam a importância em se distinguir a rinite “durante a gestação” da rinite gestacional (ou rinite induzida pela gestação). A rinite durante a gestação é uma entidade que inclui todos os tipos de rinite (alérgica, medicamentosa, não alérgica, com componente vasomotor, entre outras), as quais estariam presentes antes, durante e após a gestação por definição. Já a rinite gestacional propriamente dita é definida como obstrução nasal que não estava presente antes da gestação, tipicamente ocorrendo no segundo ou terceiro trimestre, com duração igual ou maior que seis semanas, não apresentando causa alérgica ou sinais de infecção da via aérea superior e com resolução completa dos sintomas em até duas semanas após o parto.

Objetivo do Estudo

O objetivo desse trabalho foi realizar uma revisão de literatura sobre a rinite gestacional e estender alguns conceitos com base comparativa (como fisiopatogenia e tratamento) para outros tipos de rinite na gravidez.

Epidemiologia

Aproximadamente 20-40% das mulheres reportam sintomas de rinite durante sua infância ou adolescência, e 10-30% dessas mulheres relatam piora dos sintomas durante a gestação. Estudos populacionais com amostras relativamente pequenas normalmente não fazem a distinção da rinite gestacional de outros tipos de rinite, mostrando uma prevalência que varia entre 18 a 30%. O maior estudo populacional sobre prevalência foi realizado na Suécia por meio de questionários e incluiu 599 pacientes, excluindo as que já apresentavam sinais de rinite antes da gestação, mostrando uma prevalência de rinite gestacional de 22%. Outro estudo recente, no entanto, abordou 109 gestantes por meio de questionários e rinoscopia anterior e chegou à prevalência de 9% para a rinite gestacional, tendo sido condizente com outros estudos. Não foram encontrados dados brasileiros acerca da prevalência da rinite gestacional.

Etiologia e fisiopatogenia

Apesar de muitos fatores etiológicos terem sido propostos, o conhecimento atual sobre a fisiopatogenia da rinite gestacional ainda é escasso. Pressupõe-se que o hormônio trofoblástico placentário possa estimular a hipertrofia da mucosa nasal durante a gestação.9 Além disso, o estrógeno pode contribuir para esse efeito pelo aumento do receptor de histamina na microvasculatura e nas células epiteliais. A progesterona também pode desempenhar um papel otimizando a vasodilatação local no nariz pelo aumento do volume de sangue circulante que ocorre fisiologicamente na gravidez.

Em relação aos fatores de risco para o desenvolvimento da rinite gestacional, o tabagismo foi o único identificado com evidência significativa. Considerando este fato e que uma proporção considerável de pacientes com rinite gestacional apresenta sensibilidade para o ácaro encontrado na poeira domiciliar, foi sugerido que as pacientes com rinite gestacional representam um subgrupo de rinite alérgica, no entanto, com resolução espontânea após o parto, segundo a definição.

Diagnóstico e significado clínico

A rinite gestacional se caracteriza por obstrução nasal nas últimas seis ou mais semanas de gestação, com resolução completa em até duas semanas após o parto.  O diagnóstico é clínico e pode ser suspeitado apenas pelo sintoma de piora da obstrução nasal (o qual não estava presente previamente) em pacientes gestantes e que não seja secundário a outras condições ? o diagnóstico diferencial abrange rinossinusites, rinite alérgica propriamente dita, rinite medicamentosa, infecção aguda ou subaguda da via aérea superior e granuloma gravídico.Além da obstrução, pacientes com rinite gestacional podem apresentar frequentemente coriza.

A rinite alérgica geralmente é um quadro preexistente, que também pode se manifestar durante a gestação. Ao contrário da rinite gestacional, na qual a obstrução nasal é o principal sintoma, nos quadros de rinite alérgica durante a gravidez, as pacientes apresentam coriza, prurido e espirros, além da congestão nasal.

A respiração oral causada pela piora da obstrução nasal durante a rinite gestacional pode levar a uma redução da inalação de óxido nítrico (NO) ? produzido principalmente nos seios maxilares ? até o pulmão, no qual possui um efeito redutor da resistência vascular, além da melhora da oxigenação local.  Essa redução da inalação de NO pulmonar pode ter efeito deletério no feto, levando a hipertensão materna, retardo de crescimento intrauterino, pré-eclâmpsia e menores escores de Apgar do recém-nascido.  Entretanto, não há evidência suficiente para estabelecer uma associação entre rinite gestacional e um desfecho desfavorável na gravidez.

Tratamento

Em relação ao tratamento, a maioria dos trabalhos mostra um consenso quanto à importância das medidas educacionais como primeira escolha e medida adjuvante no manejo da rinite gestacional, principalmente pelo fato de que os sintomas resolvem espontaneamente após o parto.  Com a orientação logo no início da gestação, as pacientes tendem a recorrer menos aos descongestionantes tópicos e irão apresentar menores chances de desenvolver rinite medicamentosa associada.

O exercício físico tem um efeito já bem estabelecido na melhora da obstrução nasal, no controle do peso e na melhora do padrão de sono da gestante. Elevar a cabeceira da cama em 30° a 45° também pode ajudar na melhora da obstrução nasal durante a noite. Além disso, a lavagem nasal com soluções salinas fornece um bom alívio temporário dos sintomas, apesar de não haver estudos específicos para a rinite gestacional.

Em relação aos descongestionantes tópicos, podem ser divididos em medicamentos de curta duração ? fenilefrina; ação intermediária ? nafazolina; e ação prolongada ? oximetazolina e xilometazolina. Todas essas drogas recebem uma classificação “C” da FDA (Food and Drug Administration).

Muitos autores recomendam não ultrapassar o período de uso de cinco, ou até mesmo três dias do descongestionante tópico nasal, pelo risco comprovado de rinite medicamentosa, a qual não cessa após o parto. É importante salientar que mesmo o uso somente noturno do descongestionante pode levar a essa condição.

A segurança da budesonida inalatória, já comprovada pelos numerosos estudos nas gestantes asmáticas, sugeriu fortemente que a via intranasal de administração também fosse segura, assumindo esse medicamento a categoria “B” da FDA durante a gravidez.  Entretanto, dado o fato de que nenhum dos corticosteroides tópicos parece ter efeitos sistêmicos adversos nas suas doses terapêuticas, o Colégio Americano de Alergia, Asma e Imunologia (ACAAI) afirma que é perfeitamente plausível continuar com um corticosteroide tópico diferente da budesonida em uma paciente com rinite alérgica que já o utilizava antes da gestação, com bons resultados.

Os anti-histamínicos, por sua vez, são reservados aos casos de rinite alérgica ou não alérgica eosinofílica. De forma geral, não há dados suficientes na literatura que sugerem que os anti-histamínicos como um grupo tenham um efeito deletério na gravidez. A clorfeniramina, a loratadina e a cetirizina têm sido recomendadas por existirem trabalhos em animais e humanos comprovando sua segurança.

O cromoglicato de sódio e o brometo de ipatrópio tópico, este último podendo ser utilizado quando há queixa de rinorreia acentuada, também não mostraram efeitos teratogênicos, podendo ser utilizados com segurança para a rinite alérgica durante a gestação. O uso de inibidores de antileucotrientos (como o montelucaste) para o tratamento da rinite alérgica durante a gestação não é recomendado, uma vez que há alternativas medicamentosas mais seguras.

Por fim, a cirurgia ? redução volumétrica das conchas inferiores ? tem uma papel restrito nos casos de rinite na gestação, sendo reservada para os casos mais severos, que incluem, por exemplo, gestantes com SAOS secundária à rinite gestacional e falha ao CPAP ou outros métodos terapêuticos

Conclusão

Tanto a rinite gestacional quanto a “rinite durante a gestação” são condições relativamente comuns e que vêm ganhando importância nos últimos anos, não só pela descoberta da associação com a SAOS materna e possíveis desfechos desfavoráveis ao feto, mas também pelo grande impacto na qualidade de vida na gestante. Tanto o otorrinolaringologista quanto o obstetra devem estar atentos para o diagnóstico precoce e o tratamento adequado, considerando o perfil de segurança e a evidência atual das medidas e medicamentos disponíveis.

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Fonte:  Caparroz FA, Gregorio LL, Bongiovanni G, Izu SC, Kosugi EM. Rhinitis and pregnancy: literature review. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82:113-9

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